Eu perguntei para a diarista Maria Salomé
Lopes, de 59 anos, se ela sabia quem estava concorrendo às eleições para presidente. Ela me respondeu de pronto: “É Lula e Bolsonaro, né?”. Enquanto a votação se aproxima e a disputa
entre o ex-presidente Lula e o atual presidente Bolsonaro, líderes nas pesquisas, se acirra,
Maria ainda parece longe de definir em quem votar. Eu sou Mariana Sanches, da BBC News Brasil,
e neste vídeo eu explico por que Maria é a cara dos eleitores indecisos em 2022. Maria divide com o marido e a filha uma casa
alugada em Diadema, na Grande São Paulo. A renda mensal da família é de cerca de
3 salários mínimos, somado o que ele ganha como vigia noturno, ela com as faxinas e filha
no trabalho numa confeitaria. Maria é parda, católica de ir à missa “quase
todo domingo” e estudou até a quarta série. As características dela batem em quase tudo
com o que foi mapeado por uma pesquisa Genial/Quaest, que entrevistou 2 mil pessoas presencialmente
entre os dias 11 e 14 de agosto em todo o país, e à qual eu tive acesso com exclusividade. Hoje, a maioria dos indecisos são mulheres,
católicos, pardos, vivem no Sudeste, tem renda familiar de até 5 salários mínimos,
não concluíram o ensino fundamental e tem entre 45 e 59 anos. Mas diferente de Maria, a maioria dos atuais
indecisos escolheu alguém em 2018: 34% deles votaram em Bolsonaro, contra 25% que optaram
pelo petista Fernando Haddad. Só 14% votaram branco ou nulo, como Maria. As eleições de 2022 ficarão marcadas como
aquelas com menor número de indecisos nas últimas décadas. Em 2018, eram cerca de 22%. No momento em que gravo este vídeo, já são
71%, segundo o Ipec. Sobre isso, veja o que me explicou o Felipe
Nunes, da Quaest Os indecisos, principalmente na pergunta espontânea,
que talvez seja o melhor indicador para o que a gente está conversando. São os mais
baixos da nossa história e os indicadores de interesse são os mais altos em todos os
estratos, em todos os segmentos. A pergunta espontânea é aquela feita sem
que o pesquisador mostre ao eleitor um cartão com o nome dos candidatos disponíveis. É
considerada uma medida importante de consolidação dos votos porque pessoas que nomeiam seu candidato
sem ajuda tendem a ter menos chance de mudar de ideia até o dia da eleição. Para o cientista político Carlos Melo, do
Insper, a escassez de indecisos em 2022 está Melo diz ainda que, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin anulou os processos judiciais contra Lula no ano passado e o tornou elegível
de novo, ele completou o quadro eleitoral na cabeça dos brasileiros, o que levou o
eleitor a uma escolha precoce. Mas o fato de serem poucos não os torna menos decisivos. Primeiro porque os indecisos são um dos poucos bolsões
de votos ainda disponíveis para os candidatos, já que as últimas sondagens eleitorais mostram
que mais de 80% dos que declaram voto tanto em Lula quanto em Bolsonaro já não consideram
reavaliar suas opções. Segundo porque, embora insuficientes para
inverter a ordem entre o atual primeiro colocado, Lula, e o segundo, Bolsonaro, esses quase
11 milhões de pessoas – ou 7% do eleitorado – em dúvida seriam suficientes para liquidar
a disputa ainda no primeiro turno ou forçar um segundo. Mas afinal, o que querem os indecisos? Segundo levantamento da Quaest que mapeou
o grupo, eles não estão na classe média ou entre os mais ricos. Não são também,
necessariamente, os que estão em pior situação de renda ou escolaridade. São, na verdade, uma camada intermediária,
que sonhou ter consumo de classe média, mas empobreceu recentemente. A maior concentração está dada nas regiões
metropolitanas das capitais, principalmente do Sudeste do Brasil. A gente está falando,
portanto, de gente que perdeu renda nos últimos anos e que mora aí no que a gente chama de
periferia dos centros urbanos. Quando perguntei à Maria sobre o principal
problema do Brasil, ela, que nunca recebeu parcelas do auxílio emergencial, não teve
dúvida. Maria diz que no último ano a condição
financeira da família piorou, mas não a ponto de passar fome ou não pagar o aluguel.
A mesma resposta é dada por 56% dos indecisos, segundo o levantamento da Quaest. Com base nessa resposta, seria fácil imaginar
que esse grupo tenderia a votar em Lula, já que nas pesquisas de intenção de votos ele
costuma ser apontado pela maior parte dos eleitores como uma referência no combate
à fome. Mas a escolha do voto depende de vários fatores.
E, segundo o Felipe Nunes, a localização geográfica desse grupo ajuda a explicar porque
seguem indecisos: as regiões metropolitanas das cidades do Sudeste são conhecidas por
terem sofrido historicamente com altos índices de violência. E Bolsonaro faz campanha com base na noção
do armamento de civis para combater o crime e propagando a redução nacional na taxa
de homicídios, que aconteceu nos últimos anos. A questão da segurança se torna ainda mais
complexa quando olhada pela perspectiva das mulheres, maioria entre os indecisos. Segundo Nara Pavão, especialista em gênero
e eleição da Universidade Federal de Pernambuco, elas querem o combate à criminalidade, mas
não a qualquer custo. Bolsonaro amarga rejeição em torno de 50%
entre as mulheres, em parte por sua imagem armamentista. O tema seria um dos motivos pelos quais, mesmo
tendo muita identificação com o público evangélico, o presidente ainda encontra resistência
entre as fiéis, que vem sendo cortejadas por Lula. Segundo o mapeamento da Quaest,
29% dos indecisos se dizem evangélicos. Para as mulheres também pesa a abordagem
de Bolsonaro em relação à saúde pública. Veja como Maria fala da política do presidente
para a covid. Não surpreende que a maior parte dos atuais
indecisos seja feminina. Tem sido assim historicamente no Brasil. A ciência política sempre ofereceu duas
razões principais para isso. A primeira seria uma maior aversão delas
ao risco – o que significa que só tomariam uma decisão quando se sentissem bem informadas
o suficiente. O segundo motivo seria o suposto menor interesse
das mulheres pelo cotidiano da política partidária, o que as levaria a ter menos informação
de antemão e a tomar uma decisão tardia. No caso de Maria, a falta de informação
não parece ser o problema. Embora admita que em seu convívio as pessoas falem pouco
de política, ela diz que não gostou “de nada” do que fez Bolsonaro. Questionada sobre Lula, não titubeia: “também não”. Afirma que nunca votou em nenhum dos dois.
Segundo Carlos Melo, assim como em 2018, essa será de novo uma eleição pautada pelas
rejeições dos eleitores. Há quatro anos, era um voto sobre o antipetismo.
Agora, sobre o antibolsonarismo. Os indecisos, ou os nem-nem, nas palavras de Melo, terão
que se definir entre o que lhes parece o menos pior entre esses dois mundos. Eu fico por aqui, mas volto em breve com mais
vídeos sobre a eleição. Não esqueça de seguir a gente no YouTube
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